quarta-feira, 4 de março de 2009

Professores, professoras

Professoras, professores,
por Ana Miranda

Graças a vocês, perdi o medo de um papel branco, quando tinha de fazer redações. Perdi o medo dos livros, quando era levada a ler os clássicos

Tenho muitos assuntos a conversar. Precisaria primeiro agradecer o que fizeram por mim, ainda hoje vocês estão dentro de minha cabeça, soprando palavras, gestos, soluções, como uma espécie de consciência adquirida. Tudo o que aprendi na escola pesa hoje em cada decisão que preciso tomar e, se tenho alguma organização mental, uma localização intelectual diante da sociedade, isso se deve aos esforços da educação escolar.

Depois, queria pedir desculpas pelo meu comportamento rebelde na adolescência, mas vocês eram a autoridade que eu tinha de enfrentar, eu precisava lutar pela minha liberdade, esse era meu temperamento, também precisava me localizar diante dos colegas e vocês eram um ótimo pretexto para eu mostrar que tinha solidariedade, coragem e ousadia.

Lamento hoje a minha teima em só fazer o que se aproximava da minha aptidão, que sempre foi a palavra, e nunca descobri os encantos da matemática, da álgebra, da física... Jamais esquecerei o professor que aceitou a minha resposta a um teorema, que escrevi em forma de poema. Ou o professor que me curou com elogios, ele depositava em mim tamanha confiança que eu não podia deixar de corresponder a suas expectativas. Ou o professor que me sugeria leituras e, graças a ele, eu sabia retirar na biblioteca da escola livros de alta literatura, como poemas de Maiakovski, textos coloniais de Hans Staden ou Jean de Léry, ou o livro de memórias e antropologia de Lévy Strauss, Tristes Trópicos. E tantas outras descobertas fascinantes.

Graças a vocês, perdi o medo de um papel branco, quando estudava na escola e tinha de fazer redações todos os dias. Perdi o medo dos livros quando era levada a ler os clássicos de nosso tesouro literário. Foi uma porta aberta, e aquela que escolhi para minha profissão. Nas aulas de Literatura, encantei-me com Gregório de Matos ou Manuel Bandeira. Lembro-me que decorei o poema O Menino Carvoeiro. Acho que nosso professor de Literatura tinha algo de especial, pois dois de seus alunos são, hoje, escritores dos mais atuantes na literatura brasileira: eu e Miltom Hatoum.

Hoje, acompanho a educação dos meus netinhos, Raphael, de 9 anos, e Gabriel, de 6. A cada dilema educacional dessas crianças, penso em como vocês são admiráveis. Acho a educação nos dias de hoje tão mais difícil... Tudo é tão mais complexo... As habilidades são muito mais exigidas, há uma variedade humana bem maior nas salas de aula, e as individualidades precisam ser mais respeitadas. O campo de conhecimentos é imensamente mais amplo. No meu tempo, levávamos lanche para a escola, na merendeira, e era uma fruta, um suco, um pão com queijo... Hoje os alimentos são variados e a maioria é uma tentação que faz mal à saúde, só isso já significa um trabalho imenso de educação alimentar. Há a educação curricular, a educação para a cidadania, a física, a emocional...Mas vocês dão conta de tudo isso, e nem sempre com as melhores condições. Reconhecemos e agradecemos. Abraços, felicidades, da Ana Miranda.

Disponível em: http://www.cartanaescola.com.br/edicoes/33/professoras-professores

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