terça-feira, 5 de maio de 2009

RECEBI DE VALÉRIA, PSICÓLOGA DE NOSSA ESCOLA UM EMAIL COM O TEXTO ABAIXO. REPASSO-O POR CRER SER DA MAIOR IMPORTÂNCIA... OBRIGADO VALÉRIA!!!

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) divulgou a seguinte carta escrita em homenagem a Augusto Boal, falecido neste sábado, 2 de maio.



Companheiro Boal,

A ti sempre estimaremos por nos ter ensinado que só aprende quem
ensina. Tua luta, tua consciência política, tua solidariedade com a
classe trabalhadora é mais que exemplo para nós, companheiro, é uma
obra didática, como tantas que escreveu. Aprendemos contigo que os
bons combatentes se forjam na luta.

Quando ingressou no coletivo do Teatro de Arena, soube dar expressão
combativa ao anseio daqueles que queriam dar a ver o Brasil popular, o
povo brasileiro. Sem temor, nacionalizou obras universais, formou
dramaturgos e atores, e escreveu algumas das peças mais críticas de
nosso teatro, como Revolução na América do Sul (1961). Colaborou com a
criação e expansão pelo Brasil dos Centros Populares de Cultura (CPC),
e as ações do Movimento de Cultura Popular (MCP), em Pernambuco.

Mostrou para a classe trabalhadora que o teatro pode ser uma arma
revolucionária a serviço da emancipação humana.

Aprendeu, no contato direto com os combatentes das Ligas Camponesas,
que só o teatro não faz revolução,. Quantas vezes contou nos teus
livros e em nossos encontros de teu aprendizado com Virgílio, o líder
camponês que te fez observar que na luta de classes todos tem que
correr o mesmo risco.

Generoso, expôs sempre por meio dos relatos de suas histórias, seu
método de aprendizado: aprender com os obstáculos, criar na
dificuldade, sem jamais parar a luta.

Na ditadura, foi preso, torturado e exilado. No contra-ataque,
desenvolveu o Teatro do Oprimido, com diversas táticas de combate e
educação por meio do teatro, que hoje fazemos uso em nossas escolas do
campo, em nossos acampamentos e assentamentos, e no trabalho de
formação política que desenvolvemos com as comunidades de periferia
urbana.

Poucas pessoas no Brasil atravessaram décadas a fio sem mudar de
posição política, sem abrandar o discurso, sem fazer concessões, sem
jogar na lata de lixo da história a experiência revolucionária que se
forjou no teatro brasileiro até seu esmagamento pela burguesia
nacional e os militares, com o golpe militar de 1964.

Aprendemos contigo que podemos nos divertir e aprender ao mesmo tempo,
que podemos fazer política enquanto fazemos teatro, e fazer teatro
enquanto fazemos política.

Poucos artistas souberam evitar o poder sedutor dos monopólios da
mídia, mesmo quando passaram por dificuldades financeiras. Você,
companheiro, não se vergou, não se vendeu, não se calou.

Aprendemos contigo que um revolucionário deve lutar contra todas,
absolutamente todas as formas de opressão. Contemporâneo de Che
Guevara, soube como ninguém multiplicar o legado de que é preciso se
indignar contra todo tipo de injustiça.

Poucos atacaram com tanta radicalidade as criminosas leis de incentivo
fiscal para o financiamento da cultura brasileira. Você, companheiro,
não se deixou seduzir pelos privilégios dos artistas renomados. Nos
ensinou a mirar nos alvos certeiros.

Incansável, meio século depois de teus primeiros combates, propôs ao
MST a formação de multiplicadores teatrais em nosso meio. Em 2001
criamos contigo, e com os demais companheiros e companheiras do Centro
do Teatro do Oprimido, a Brigada Nacional de Teatro do MST Patativa do
Assaré. Você que na década de 1960 aprendeu com Virgílio que não basta
o teatro dizer ao povo o que fazer, soube transferir os meios de
produção da linguagem teatral para que nós, camponeses, façamos nosso
próprio teatro, e por meio dele discutir nossos problemas e formular
estratégias coletivas para a transformação social.

Nós, trabalhadoras e trabalhadores rurais sem terra de todo o Brasil,
como parte dos seres humanos oprimidos pelo sistema que você e nós
tanto combatemos, lhes rendemos homenagem, e reforçamos o compromisso
de seguir combatendo em todas as trincheiras. No que depender de nós,
tua vida e tua luta não será esquecida e transformada em mercadoria.

O teatro mundial perde um mestre, o Brasil perde um lutador, e o MST
um companheiro. Nos solidarizamos com a família nesse momento difícil,
e com todos e todas praticantes de Teatro do Oprimido no mundo.

Dos companheiros e companheiras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

02 de maio de 2009

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